About Me

header ads

[RESENHA #459] CANÇÃO DE NINAR - LEILA SLIMANI


Título: Canção de Ninar
Autora: Leïla Slimani
Editora: TusQuets (Planeta de Livros)
Páginas: 192
Ano: 2018
ISBN: 9788542212037
Onde Comprar: Amazon - Saraiva

Sinopse: 
Quem cuida dos seus filhos quando você não está olhando? Apesar da relutância do marido, Myriam, mãe de duas crianças pequenas, decide voltar a trabalhar em um escritório de advocacia. O casal inicia uma seleção rigorosa em busca da babá perfeita e fica encantado ao encontrar Louise: discreta, educada e dedicada, ela se dá bem com as crianças, mantém a casa sempre limpa e não reclama quando precisa ficar até tarde. Aos poucos, no entanto, a relação de dependência mútua entre a família e Louise dá origem a pequenas frustrações – até o dia em que ocorre uma tragédia. Com uma tensão crescente construída desde as primeiras linhas, Canção de Ninar trata de questões que revelam a essência de nossos tempos, abordando as relações de poder, os preconceitos entre classes e culturas, o papel da mulher na sociedade e as cobranças envolvendo a maternidade. Publicado em mais de 30 países e com mais de 600 mil exemplares vendidos na França, Canção de Ninar fez de Leïla Slimani a primeira autora de origem marroquina a vencer o Goncourt, o mais prestigioso prêmio literário francês.

Resenha: Canção de Ninar é um drama que fala sobre relações de poder, o papel da mulher nos dias atuais e a escolha de ser mãe ou não e como isso influencia na sociedade. Paul e Myriam são um jovem casal francês – ela é descendente de árabes – que sempre teve sonhos bem ambiciosos. Ele quer ser um produtor musical renomado e reconhecido no meio artístico e ela quer ser uma advogada de prestígio e ascensão meteórica. O que não esperavam é a chegada de uma criança tão cedo em seu relacionamento.

"Sua mulher parecia se encontrar nessa maternidade animal. Essa vida de casulo, longe do mundo e dos outros, os protegia de tudo." p. 14.

A chegada da primeira filha, Mila foi recebida com espanto e amor ao mesmo tempo. Eles se hospedaram num pequeno apartamento numa área bem movimentada e de grande destaque na capital francesa. A filha é de temperamento explosivo e com traços de animosidade que são vistos constantemente em seus ataques de procura de atenção e típico de crianças mimadas. Mila ainda nem completara os anos iniciais da infância e ver o nascimento de seu irmão Adam ser visto como uma desculpa de sua mãe para prolongar sua estadia como dono de casa exemplar. Porém o que começara como um desejo de Myriam transformar-se em um pesadelo e perturbação, porque ela vê seus colegas de faculdade crescendo em suas funções e somente ela renegada ao papel de mãe.

"Mas em que lago negro, em que floresta profunda ela foi pescar esses contos cruéis onde os bons morrem no final, mas não antes terem salvado o mundo?" p. 32.

Tomada pelo anseio de prestígio e funções de maior destaque em sua existência, Myriam convence Paul que deve retornar ao mercado de trabalho, já que fora convidada a trabalhar com um colega de universidade e assim decidem abrir uma seleção para contratar uma babá para seus filhos. Eles têm sorte – ou azar – em encontrarem a adorável e impecável Louise. Uma francesa de modos contidos e altivez aristocrata que conquista com facilidade seus empregadores, porque é uma babá exímia e até se encarrega de tarefas além de suas funções. 

O que podia ser o início de uma nova fase para Paul e Myriam e seus filhos Adam e Mila acabam se desenrolando numa sucessão de acontecimentos dramáticos e espantosos para os leitores. Será que as novas relações de poder não se tornaram dependentes demais? Será que tratamos babá e profissionais de categorias vistas como “domésticas” como seres humanos? Ou os renegamos a invisibilidade social e a olhares desconfiados e de preconceito?
Opinião: Canção de Ninar é um thriller de tirar o fôlego do começo ao fim, porque a autora traz uma personagem perturbadora e destrinchada para os leitores. Ela utiliza o protagonismo feminino para discutir sobre os atores sociais, a mudança na relação de poder e principalmente nas escolhas femininas. Myriam é apresentada como uma jovem mulher levada pela ilusão do prestígio constante na carreira. Ela é convencida pelos outros que o papel de mãe é algo de baixo escalão e sem destaque algum par o meio social, então ela ver sua responsabilidade de educar e observar o desenvolvimento de seus filhos serem deixados nas mãos de uma mulher que ela apenas tem “boas referências” empregatícias. Paul é aquele homem como grande parte dos demais que não sabe ou finge não saber que tem responsabilidades domésticas e paternas sob sua casa e filhos. Ele não se importou se a esposa estaria feliz em ser mãe e muito menos se estaria agraciada em se afastar de suas ambições pessoais.

Esses dois pais acabam mostrando o quadro atual da contemporaneidade. Myriam que é aquela mulher que sofre com a “revelação” social de que as mulheres vão e devem ir além do papel materno. É a personagem que se sente insatisfeita com o cansativo e deprimente papel de mãe. Ela se compara com outras pessoas e alimenta em seu âmago a necessidade impensada de prestígio profissional. Ela acredita que ser mãe anula sua carreira e não que sua frustração vem desde a ideia errônea que a criação dos filhos é apenas função das mulheres e não participação mutua e indivisível de pais e mães.
Quando Louise adentra o lar desses personagens, somos apresentados a uma mulher que espelha ser uma profissional competente e única diante um universo de babás, porém ela nada mais é uma vítima do modelo social divisório e inconcebível baseado em papel de gêneros. Louise é uma mulher francesa, todavia sofre como qualquer outra mulher de outro país. Porque sofreu com as responsabilidades impostas a ela por ser do sexo feminino. Fora mãe quando simplesmente não queria e acabou vendo-se indiferente a sua filha e totalmente incapaz de amá-la. Era jogada e humilhada por homens machistas e empregadores abusivos e preconceituosos.

Quando lemos essa obra percebemos o talento e trabalho indiscutível da autora franco-marroquina em debater temas tão atuais como são as relações frágeis e liquidas entre padrões e empregados e como tratamos as pessoas com preconceitos e desprezo. Por ser marroquina, ela introduz uma inegável atenção à indiferença e tratamento desprezível de muitas pessoas aos estrangeiros em seus países. Canção de Ninar é um thriller que discute sociedade, papel feminino na mesma, relações de poder e a liberdade de escolha pessoal independente do gênero sexual que seja.
Sobre a Edição: A capa é simples, mas traduz significativamente o quadro social retratado na obra. A fonte é muito boa para a leitura e as folhas amareladas dão um toque especial ao livro. A revisão ficou muito boa e o selo TusQuest demonstrou toda a qualidade da Planeta de Livros.
Sobre a Autora: Leïla Slimani nasceu em 3 de outubro de 1981 na cidade de Rabat, Marrocos. Escritora e jornalista franco-marroquina, Slimani vive na França desde os 17 anos e em 2016 foi premiada com o Prêmio Goncourt por seu romance Chanson Douce, publicado no Brasil como Canção de Ninar. Esse livro tornou-se um best-seller com mais de 450 mil cópias vendidas antes mesmo de receber a premiação Goncourt.

Postar um comentário

0 Comentários